Fomos com um grupo jantar fora, à nossa frente estava um amigo que gosta muito de ler, lê muito, diz ele e nota-se, pela sua fluência, pelos seus conhecimentos, pelo seu ser e sentir. Vai daí que falou em livros e mencionou vários autores modernos e clássicos que tem lido, só Saramago é que não, que é "muito massudo e chato, que não usa pontuação que é muito difícil"! Logo ali me propus reler Memorial do Convento, contudo ao abeirar-me da estante à procura do nosso NOBEL DA LITERATURA dei de caras com Cadernos de Lanzarote, um diário muito interessante que estou lendo devagar como convém aos escritos de Saramago e se "vida havendo e saúde não faltando" esta leitura chegará ao fim!
Claro que não é um escritor que se possa ler como quem vai ali e já vem, como quem vai apressadamente apanhar o autocarro, não, não é leitura que se possa definir como apressada mas pensada, pausada e repetida para finalmente darmos por nós a pensar:
-Mas como é que este homem diz isto, um pensamento tão elevado, de uma maneira tão simples? como é que ele afinal diz o que eu penso de uma maneira que eu não saberia expressar?
Porque eu também, como ele, " Como sinal da idade, sinto uma nova preocupação de ir buscar na cara dos outros e nas fotografias recentes, os estragos que supunha ainda não me terem marcado", contudo sei que em cada minuto que passa "o que era deixou de ser", o que me vale é que " também em cada minuto vou restaurando de memória a memória do que fui, e sei que "sou em cada momento a outra e a mesmo"
É por isto, e por muito mais, que me falta engenho e arte para expôr, que considero que foi muito justo que o primeiro Nobel da literatura para a língua portuguesa, tenha sido dado a este português, porque ele soube dizer de forma muito simples o que eu penso, que estou a envelhecer, que procuro esses sinais nos outros , no espelho e nas fotografias mas que me sinto sempre aquela menina de laçarote a cujas memórias me agarro fortemente para levar de forma descontraída e de certa forma elegante, esta caminhada até ao fim!
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