terça-feira, 30 de junho de 2020

Nada a esconder...

Lição de vida:

Li há tempos uma história, muito engraçada, que falava do nervosismo de uma jovem no primeiro dia em que foi a casa dos pais do namorado. Indo a caminho, constatou que tinha os sapatos sujos e, resolveu limpá-los com um guardanapo de papel, com que tinha embrulhado uma sandes de presunto. Ao chegar à casa do noivo foi recebida e cumprimentada com agrado pelos pais do rapaz e farejada pelo cachorro da casa que não a largou por sentir o cheiro do presunto.
Na hora da despedida, foi elogiada pelos pais do noivo que fizeram referência ao cachorro que não tinha o hábito de ser dócil e que tinha gostado dela sabendo julgar o carácter das pessoas.
-Se o cachorro gostou de você - disseram eles -  para nós isso é um sinal e será um prazer recebê-la como um novo elemento da nossa pequena família!
Estando nas Lajes, freguesia hoje vila, onde nasci e me fiz mulher, a restaurar a casa dos meus pais, lembrei-me desta história deles e do primeiro dia que me acompanharam a casa do meu noivo, hoje marido. Fomos recebidos também com muita gentileza, à semelhança da história anterior, e para nos integrarem no seu ambiente mostraram-nos as várias divisões da sua casa, grande e boa, uma casa da cidade, como se dizia na altura...
Chegou o dia de se retribuir a visita e lá vieram, em dia de festa, os novos familiares a nossa casa.
Minha mãe, que era a especialista em etiqueta, como dizia o meu pai a brincar, resolveu também mostrar a nossa casa simples mas na qual nos sentíamos muito bem e onde éramos felizes.
- Mas - disse eu - é uma casa simples, não tem nada de especial para mostrar!
- Não tem nada para mostrar, ou tem pouco para mostrar, se comparada com a vossa casa - diz o meu pai prontamente - mas também não tem  nada a esconder, o que já é muito bom!
Esta foi uma das mais importantes lições de vida que recebi do meu pai e que nunca esqueci, mesmo que tenhamos pouco a mostrar, se não tivermos nada a esconder, já é uma grande riqueza...
É por isso que estou a restaurar, com orgulho e vontade, a nossa casa das Lajes, porque ela me traz gratas e doces recordações como esta!
E aqui vai a nossa foto tirada em 1971,contemporânea desta história que te conto.


domingo, 28 de junho de 2020

Especiarias e especieiros:

Hoje fiz caldeirada para o almoço - nada de especial dirás - é verdade, contudo eu que não sou de seguir receitas pré estabelecidas,dei por mim a usar diferentes sabores, porque considero que a comida fica com um sabor incompleto sem temperos, são eles que lhe dão aquele toque de magia, aquele aroma que faz com que apreciemos o que está na travessa, terrina ou no prato.
Mas comigo as coisas não funcionam simplesmente, é um pouco mais complicado, enquanto manuseava os frascos com os temperos que ia utilizando, dou por mim a matutar em tempos recuados em que só os mais ricos tinham acesso às especiarias e em que as mesmas tinham o valor do ouro chegando-se ao ponto de serem deixadas, em testamento, quantidades de especiarias e muitas vezes eram usadas como moeda de troca ou para pagar ou subornar favores, e no tempo em que cidades europeias como Veneza e Génova cresciam em riqueza à custa das especiarias, anis estrelado, cominhos, gengibre, canela, noz-moscada, cravo da índia, pimenta, cominhos, açafrão, levando o nosso pequeno país à beira-mar plantado, conhecedor  desta fabulosa possibilidade de enriquecer, e conhecedor das rotas destes produtos até ao Oriente, a aventurarem-se e a lançarem-se numa verdadeira epopeia marítima até à Índia.
Claro que  isto não passa de uma pequena e pobre resenha do muito que haveria a dizer sobre o assunto o qual aflorei para registar o quanto temos a vida facilitada, neste capitulo, basta só ver a grande variedade de produtos que temos à nossa disposição que temos à nossa disposição o e de novos produtos resultados da combinação de várias especiarias como é o caso da paprika do caril e outros.
E agora, está à espera que eu mostre a dita caldeirada? Impossível, praticamente já quase não existe, o que te mostro são os meus especieiros lindos e antigos que, como o nome indica,são utilizados para servir especiarias na mesa.
Votos de boa semana!










sábado, 20 de junho de 2020

E tudo se esfumou!


Estava eu muito bem sentada
E muito bem acompanhada
Nos degraus da nossa catedral
Não se avistava nada de mal!
O covid não existia,
Não se falava em pandemia, 
Vivia-se muita alegria,
E o povo contente sorria...
Muita luz e muita cor,
Música e um suave calor,
No ar pairava o amor 
E a S. João um clamor.
E o cortejo já se via...
O chefe do protocolo cumprimentava,
As aias eram lindas de verdade,
A rainha a todos acenava,
Ai Angra com tanta beldade!
E nós todos embevecidos
E ao criador agradecidos,
Por vivermos em harmonia
por termos saúde e alegria.
Mas, algo estranho aconteceu...
Repentinamente amanheceu
E eu estremunhada acordei
E logo logo pensei:
-Isto não passou de um sonho
Um sonho pouco risonho
Tudo o que era bom se esfumou
E tudo, tudo mudou!

Clara Faria da Rosa
20/06/2020




segunda-feira, 15 de junho de 2020

Um ano diferente:

Realmente, este é um ano diferente em todos os aspectos, sociais, culturais, recreativos e religiosos... Não fora isso, a esta hora as Bicas de Cabo Verde estariam coalhadas  de gente e a coroação já ia a caminho da igreja, a filarmónica encheria os ares com os seus acordes apropriados e as coroas luziriam nas mãos das senhoras, que se tinham predisposto a levá-las, para depois virem nas cabeças das crianças coroadas. 
O Império estaria lindo, com o altar cheio de flores ricas e exóticas, em arranjos feitos por mãos devotas e habilidosas e nas nossas casas recebiam-se amigos e familiares para um almoço melhorado... Infelizmente tudo isso foi adiada, contudo, a comissão resolveu que o império estaria neste dia aberto, e que o Senhor Espírito Santo ocuparia o seu devido lugar, embora decorado com modestas flores, e com pouco engenho e arte, foi do coração!
Não há pandemia que faça esquecer esta fé, esta ancestral devoção ao Divino Espírito Santo!



domingo, 7 de junho de 2020

Crenças:

Hoje é o domingo da Trindade e, na Terceira. seria o dia do segundo bodo e haveria coroações sopa cozido, arroz-doce,pão e vinho em abundância para toda a gente, em louvor do Divino Espírito Santo. Acontece que este ano as coisas não seguirão esta regra, está tudo ainda muito recolhido devido à pandemia do covid, não haverá  as tradicionais brindeiras de cabeça airosa que a todos agradam, não haverá, é como quem diz, porque aqui te mostro a cabeça de um pão do bodo de 2019, esteve um ano inteirinho, muito arrumadinho num canto da gaveta dos panos da loiça e aqui está ela durinha nem pedra mas bolor nem vê-lo, estava à espera da cabeça da brindeira deste ano para ser substituída!
As nossas antepassadas tinham destas coisa acreditavam que o pão bento não embolorava e guardado em casa abençoava a família e fazia que a vida levedasse, medrasse, encarreirasse... e, pelos  vistos, ainda há quem acredite e mantenha a tradição de guardar a cabeça da brindeira de um ano para o outro, também não perdemos nada em tentar pelo menos perseveramos esta singela e mimosa tradição!

quarta-feira, 3 de junho de 2020

A maçã podre:



Junto com a foto que aqui inseri, no dia da criança, encontrei esta do mesmo grupo, mas de um ano diferente, está amorosa, até me ri sozinha ao ver os dois lá atrás de braços cruzados, numa pose de homenzinhos e o Labandeira, sentado no muro à esquerda, com aquele seu ar agarotado. e o Cláudio e o Nuno no muro à direita, com as nuvens à volta da cabeça, parecem anjos no céu!
Mas hoje vou contar uma história de outro aluno, o José Cardoso que está sentado entre a Raquel  e o Edgar e veste camisa branca. O José era um pouco mais velho do que os companheiros e tinha a sua exploração de galinhas, nos terrenos do pai, na Grota do Vale, eu até dizia a brincar que era o meu aluno avicultor.
Os alunos geralmente iam a casa almoçar e certo dia o José foi a casa almoçar e despachou-se depressa para vir jogar à bola com os companheiros, antes porém, entrou na sala para me visitar, nem que já não me visse há muito tempo!
-Então José - Pergunto eu - que tal foi o almoço?
- Para consolar - responde -  dois ovos estrelados, das minhas galinhas, linguiça frita, uma pratada de batatas fritas, um chocolate que comprei na venda - de registar que ele tinha o seu próprio dinheiro, pois vendia os ovos da sua exploração -  e ainda trago esta maçã! remata, muito satisfeito...
- Ó homem, não podes comer mais agora - digo eu - deixa aí na mesa a maçã para comeres no intervalo!
E lá continuou ele de cotovelos fincados na minha secretária e com a cara entre as mãos, a ver-me corrigir os trabalhos até  que, naturalmente depois de muito pensar, diz:
- A Senhora professora pode ficar com a maçã para si, eu ofereço, mesmo não ia comê-la porque está meia podre!
- Ó garoto, ias oferecer-me uma maçã podre! - digo eu entre o zangado e o divertido...
Ao que ele  responde já a caminho da porta, de olhos gaiatos e na cara um sorriso divertido:
Ainda se aproveita alguma coisa!...
E lá foi ele, para a brincadeira, para o sol, para a vida!!!
Humildemente confesso: - sinto-me muito orgulhosa e grata por a vida me ter proporcionado momentos como este, não me importava nada que alguma criança me voltasse a oferecer uma maçã meia podre. Saudades!

terça-feira, 2 de junho de 2020


BRISA DO MAR...

- Se eu fosse a brisa do mar,
Murmurava bem baixinho,
À Lua, ao Sol e à Terra,
À paz, à calma e à guerra,
Aos montes, vales e cidades...
- Eu sou a brisa do mar,
E vejo o Mundo a Girar,
E os homens a sofrer,
As mulheres a gerar,
E as crianças a crescer...
- Eu sou a brisa do mar,
 E quero pedir ao Mundo,
Que olhe bem à sua volta
E acabe com a revolta
E semeie o perdão,
O amor e a gratidão,
E ouça o meu murmurar
Que a todos quer recordar
Os valores do passado,
E que o Mundo está mudado
Com falta de uma linda flor
Que lhe traga nova cor!

Clara Faria da Rosa

segunda-feira, 1 de junho de 2020

Agora estamos pobres!

Em dia da criança:

Hoje celebra-se o dia da criança, está mais do que assente que todos os dia são dias da criança, da mulher, do pai, da mãe, do irmão e outros que tais....Contudo , embora concorde com esta corrente, por outro lado, também defendo que  estes dias são uma chamada de atenção para certas problemáticas e para reflectirmos sobre elas e em, em certos casos, corrigirmos certas posturas e  atitudes. Vai daí que hoje, enquanto tratava dos meus afazeres domésticos, pensei muito e com imensas saudades, em todas as crianças que passaram na minha vida profissional, concluindo com pesar que talvez não tenha feito por elas o suficiente ou que nao tenha  atingido em pleno os objectivos pedagógicos propostos, enfim, fiz o que soube e pude sempre com muito carinho,  vontade e respeito por aquelas crianças que me tinham sido confiadas.
Acontece que entre todas as crianças de que te falo, num certo ano lectivo, na escola de Ladeira Grande na freguesia de Ribeirinha, na ilha Terceira tive um aluno chamado William Lopes Pires, os pais do William, imigrantes, na Califórnia, tinham decidido regressar à terra natal com os seus filhos para que estes crescessem e se fizessem homens e mulheres num ambiente mais calmo, mais de acordo com os seus valores.
 Vai o William para  a escola, uma criança encantadora, com um vocabulário português um pouco deficiente em relação aos colegas da mesma idade. Certo dia , muito irrequieto, não parava... Falava para os companheiros, levantava-se, enfim estava a ser-lhe difícil aquele dia!
Então eu, talvez também cansada e sem pensar abro a boca e...
- William, não paras, não te calas, não tens educação?!!!
Ainda bem não tinha pronunciado estas palavras, já me tinha arrependido e então quando vejo aquele palmo de gente, de cara muito redondinha e cabelos pretos encaracolados olhar para mim com uns olhos muito pretinhos, brilhantes inocente e meigos responder-me : Não, a minha mãe diz que agora estamos pobres... Fiquei de tal maneira triste, arrependida e envergonhada que ainda hoje passados que são tantos anos ainda me lembro disso!
Aquela criança estava habituada a outro meio a outras coisas que pedia  à mãe que não podendo satisfazer o pedido do filho dizia : - Não pode ser, agora estamos pobres!
E lá andava o William no meio daquela grande mudança na sua vida sem ter o que queria, conhecendo poucas palavras e com uma professora empertigada que se esquecia disso tudo!
Afinal uma criança é um mistério que tem que ser alimentado mas sobretudo acarinhado, respeitado e compreendido, Neste dia da criança, peço desculpa a todos os meus alunos que não compreendi ou não amparei no momento certo e apresento-te o William com os seus colegas de turma, de quem tenho muitas saudades, aqui na foto, sentado, à direita.