" - Aí estás à beira da cova, na urna aberta, para te reconhecermos pela última vez, onde está a tua pessoa, onde está o que tu eras? Agora és apenas uma imagem. Que é de ti? ouço para além dos teus lábios cerrados a tua palavra grave, vejo as tuas mãos erguerem-se, povoadas de um gesto que eras tu. Não! quem te habitava já não é. Viverás ainda na memória dos que te conheceram. Depois esses hão-de morrer.Depois serás exactamente um nada, como se não tivesses nascido! Eis que começa a tua longa viagem para a vertigem das eras, para a desaparição no silêncio dos milénios. Sim, agora ainda vives para mim porque te sei.........."
Como eu, Clara, sei desta foto de tantos que já lá vão, que foram esquecidos na voragem do tempo, no meio dos quais está a minha bisavó materna Maria José, de pé, no meio dos seus irmãos, de quem tenho memória breve, de ouvir falar, não de conhecer, perturbando-me pensar que o rasto dela está suspenso de mim, porque eu tenho ainda uma pequena notícia da sua vida, um ligeiro e quase que apagado eco do que foi a massa complexa do seu ser e sentir, depois...ficará como os seus irmãos da foto, ficará nessa amarelecida fotografia de forma absurda, inquietante, incrível, com uma face a falar ainda e com um olhar que procura os que a olham, que a fitam, mas não a sabem!
Como eu, como quem me lê neste momento, somos pessoas vivas, podemos, pensamos ter o mundo nas mãos, porque temos saúde, não pensamos na morte mas... sem que nos perguntem chegará a morte e não seremos fisicamente nada, seremos o mesmo que éramos antes de termos nascido! Então ficaremos pendentes dos nossos descendentes olharem as nossas fotos, lembrarem os nossos feitos e depois seremos cinza para lembrar neste dia ...
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