sábado, 13 de outubro de 2018

A vinha da Caldeira

"Quem tem rabo tem medo"
A caldeira das Lajes, na ilha Terceira, Açores, é um lugar muito calmo e pitoresco, com muitas vinhas, e um caminho pedonal que leva os caminhantes até uma agradável piscina. Tenho lá uma vinha, que é rodeada por muitas outras, abandonadas, porque os donos faleceram ou entendem que é mais fácil e mais barato, comprar vinho engarrafado nas grandes superfícies comerciais. Porque  não queremos que o nosso espaço seja infestado com as espécies que vêm dos terrenos contínuos, fomos lá com homens de trabalho, para que se fizesse uma limpeza.
Ao olhar para as curraletas, separadas com as características pedras negras de basalto, decoradas com os ramos de videira que por elas trepavam, pensei no meu pai. Sim, pensei que ele devia estar feliz, por ver a vinha, que era a menina dos seus olhos, limpa e tratada. Pensei também na azáfama dos dias que antecediam a vindima para se prepararem os balceiros, as pipas, o lagar, os cestos e tudo o mais...
Vi-me a balançar, metida no balceiro, com os meus primos, só com a cabeça de fora, e com os nossos chapéus de palha, parecíamos girassóis. Cheirei as sacas de retalhos e as cestas onde vinham os chicharros de cebolada, o pão, o sumo e o vinho para o almoço, lembrei-me dos pratos azuis de plástico, comprados propositadamente para os dias da vindima e lembrei-me de uma vizinha, amiga da minha mãe, uma mulher muito conhecida e característica, que tinha sempre uns ditos engraçados - A tia Rita Ventura, que Deus a tenha junto de si!
Lembrei-me que certo ano, a tia Rita, foi ajudar na vindima, mas como era muito gulotona, não resistiu a saltar ao prédio do vizinho para uma barrigada de figos, satisfeita de tanto figo, ala apanhar uvas, eis senão quando ouve-se uma gritaria:
Comeram tudo, comeram tudo, não ficou nada!
A desgraçada, com a consciência pesada, só se lembrou dos figos que tinha comido, deu-lhe uma tal dor de barriga que a obrigou a acocorar-se numa curraleta mais funda, à espera do que desse e viesse...
Afinal o homem gritava porque uns porcos tinham ido ao almoço, guardado à sombra de umas faias, e o que a minha mãe, com tanto gosto, preparara, já não era comestível, tivemos que voltar para casa para um almoço improvisado!
Ainda a estou  a ouvir dizer ao meu pai:
- Ai Chico, que susto, já me estava a ver na polícia, ai se o meu "home" sabe disto!...
Ao que o meu pai, aborrecido com o acontecido respondeu:
- Ora tia Rita, a tia sabe bem que  "quem tem rabo tem medo"! 











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